Indicação Geográfica estimula cafeicultores a melhorar a qualidade do café

Tomar um café e sentir o aroma caramelizado típico dos grãos do Cerrado Mineiro. Buscar uma bebida mais cítrica exclusiva do Circuito das Águas Paulista. Isso pode parecer conversa de degustador, mas há uma tendência do consumidor no Brasil de saber cada vez mais sobre as características, a origem e a qualidade do produto. Por isso, os cafés especiais estão conquistando o paladar dos brasileiros. O principal atrativo deles é a valorização no mercado.
Nathan Herszkowicz, diretor executivo da Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic), explica que os grãos chegam a custar mais que o dobro da commodity tradicional. Com relação ao mercado externo, os cafés especiais representam uma fatia de 15% dos 30 milhões de sacas exportadas, diz Herszkowicz, mas no Brasil, a procura por esse produto ainda é tímida.
A Abic estima que 4% dos grãos consumidos são gourmet (800.000 sacas por ano), no entanto, esse número pode aumentar para 10% nos próximos 15 anos. De olho no crescimento desse público mais exigente, regiões como Mantiqueira de Minas, oeste da Bahia e Circuito das Águas Paulista estão buscando, por meio de selos de Indicação Geográfica (Denominação de Origem e Indicação de Procedência), o reconhecimento para os seus produtos.
Algumas dessas regiões se inspiraram no modelo do Cerrado Mineiro. Em 2013, os produtores de lá foram os pioneiros em provar que o meio geográfico onde estão inseridos (clima, solo, relevo, temperatura e práticas de produção) influencia na qualidade do grão. Eles conseguiram a primeira Denominação de Origem (DO) para o café no Brasil.
De acordo com o superintendente da Federação dos Cafeicultores do Cerrado, Juliano Tarabal, nos últimos quatro anos, já foram contabilizadas aproximadamente 500.000 sacas de café com o selo de origem de qualidade. O processo para conseguir o registro, porém, possui custos altos: para conseguir o selo, entidades podem desembolsar até R$ 1 milhão só com despesas de consultoria e estudos, entre outros. Após o reconhecimento, há ainda gastos com a rastreabilidade e ações de marketing. “São vários investimentos, porque a DO sozinha não tem valor”, destaca o cafeicultor.
Viabilidade do processo
Para Tarabal, embora o processo seja demorado e caro, os benefícios compensam bastante. O superintendente ressalta que a DO garante a qualidade do produto e protege o nome geográfico da região, evitando fraudes. “É necessário que somente os cafés com o selo possam ser reconhecidos como do Cerrado Mineiro, por exemplo.”
A região de Mantiqueira de Minas, que é conhecida tradicionalmente pela produção dos cafés de montanha, também busca diferenciar seus produtos. Em 2011, conquistou o selo de Indicação de Procedência (IP) e, no ano passado, já certificou 36.000 sacas.
Segundo o presidente da Associação dos Produtores de Café da Mantiqueira (Aprocam), Antônio José Junqueira Villela, os procedimentos obrigatórios para obter a IP elevou a qualidade dos grãos. “Nós quase não achávamos cafés 80 pontos na região (pontuação obtida com a metodologia da Classificação e Prova dos Cafés Especiais, da SCAA). Hoje, é difícil quem ainda produz esse tipo de produto, é tudo acima.”
Em 2016, também os produtores da Mantiqueira deram um novo passo em busca do selo de Denominação de Origem. Há cinco anos, a região ganhou destaque no mercado externo. Antes, os produtores vendiam para um intermediário, responsável pela exportação, hoje, eles já exportam diretamente para 13 países. Para obter a DO, a região melhorou o processo de pós-colheita. Villela ressalta que é muito importante colher os grãos todos os dias e separar o máximo possível os cafés maduros, que possuem maior qualidade (cereja), dos outros grãos.
Primeira conquista
No final do ano passado, a região do Circuito das Águas Paulista começou a se estruturar para também reconhecer a exclusividade de seu café. Com lavouras situadas na Serra da Mantiqueira entre 850 e 1.350 metros de altitude, o local possui grãos com intenso aroma frutado e floral. A consultora do Sebrae que está acompanhando o processo, Cintia Maretto, afirma que 30 produtores estão reunidos para formar uma associação ainda neste ano. “Eles têm de criar regimentos e padrões de qualidade”, afirma.
A região oeste da Bahia também está prestes a receber a primeira Indicação Geográfica, na modalidade de Indicação de Procedência. A Abacafé, associação dos produtores da região, fez o pedido em 2014. Em março deste ano, receberam o parecer do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi) para realizar os últimos ajustes. Segundo Ivanir Maia, consultor que acompanha o processo, o café que receberá o selo será aquele produzido acima de 740 metros de altitude.
Na região, as máquinas são responsáveis por realizar os processos de colheita, secagem e também de preparação do solo. Além disso, o clima típico da região nordeste determina diferentes práticas de produção.
O café do oeste da Bahia é 100% irrigado. Maia ressalta que a falta de chuvas nos períodos de colheita evita um dos grandes vilões da cultura cafeeira: a umidade. “Eu consigo ter um percentual (de grãos) de maior qualidade e que pode ser chamado de cafés especiais.”
